Confiram as fotos da peregrinação de alguns membros de nossa comunidade ao Santuário de Divina Pastora, por ocasião do Ano Santo da Misericórdia:
Os Salmos da Misericórdia - Parte 4 (final)
Continuação da reflexão dos Salmos da Misericórdia
Proposta: antes de ler a presente reflexão, faça uma leitura orante do salmo 92 em sua Bíblia.
Proposta: antes de ler a presente reflexão, faça uma leitura orante do salmo 92 em sua Bíblia.
7. Salmo
92
(Cântico. Para o dia de sábado). Este salmo é um típico exemplo de hino e pode
ser subdividido da seguinte forma:
Vv. 2-4. Convite a louvar o Senhor. A bondade da ação de
graças dirigida a Deus no cântico não para (v. 3): do romper da manhã e durante
toda a noite. A bondade e a fidelidade são atributos divinos que são louvados.
O imaginário do saltério recorre a instrumentos musicais para descrever a alma
do louvor, no qual o canto e a música se harmonizam para exprimir a alegria do
espírito do orante.
Vv. 5-14. Corpo do hino. Os vv. 5 e 10 marcam a divisão em
duas estrofes do corpo laudatório:
Vv. 5-9. O Senhor é mais forte do que os malfeitores. Os
dois primeiros versículos (5-6) concentram-se no Senhor. Ele é o motivo de
alegria para o orante, por causa de suas maravilhas e da obra de suas mãos,
segundo o estereótipo da sua ação como Criador. Mas a experiência do salmista
(vv. 7-8) não é universal, no sentido de que não é experienciada por todos os
seus semelhantes; pelo contrário: o homem insensato não a conhece e o ignorante
não a compreende. O juízo sobre a sorte deles é claro: como a erva tem vida
breve, assim a vitalidade dos malfeitores é somente um fenômeno momentâneo. À
brevidade da sua vida sobre a terra corresponde, por acréscimo, uma ruína
eterna. A superioridade do Senhor não teme o obscurecimento momentâneo do seu
projeto, porque Ele, do alto de sua posição, tudo domina. Ele é excelso,
substantivo, com conotações históricas e mitológicas: o maior entre todos os
deuses, o inatingível, o imbatível.
Vv. 10-14. Depois das declarações do v. 8, reafirma-se a
clara convicção de que os malfeitores – aqui chamados de ‘inimigos’,
confirmando o perfil negativo que até aqui se foi traçado -, serão eliminados e
dispersos (v. 10). Continuando a analogia com a erva do campo, diz-se que eles
perecerão e serão dispersos. A imagem do búfalo (v. 11) é particularmente
evocativa. O orante, que recupera as próprias convicções de fé perante o
possível descrédito representado pelos malfeitores, é apresentado como um
búfalo no auge de sua força muscular, animal indômito que não se sujeita a ser
utilizado na agricultura e cuja ferocidade o faz levar sempre a melhor sobre os
inimigos. A unção (v. 11) tonifica o músculo, fá-lo mais esplendoroso e
preparado para a batalha. Da descrição desta força da natureza passa-se ao
contexto totalmente humano do desafio entre inimigos (v. 12): o olhar lançado
contra o próprio adversário exprime coragem e desdém. O segundo símbolo que
domina o salmo é a palmeira (vv. 13-14). A ênfase se dirige não tanto para os
frutos, mas para o vigor, em coerência com a outra imagem, a do búfalo. A
proximidade ao cedro do Líbano confirma a ideia do poder que caracteriza o
justo, que está fixo, bem plantado como um mastro extraído do tronco desta
planta. A particularidade destas duas árvores está no lugar em que foram
plantadas, porque embeleza o átrio do Templo. A mensagem parece ser a seguinte:
somente se o orante permanecer no espaço da fé pode desfrutar da seiva que
provém do Senhor e receber estabilidade.
Vv. 15-16. Estes dois versículos encerram a composição que,
segundo o gênero literário do hino, deveria servir para reiterar o convite ao louvor.
Aqui tal convite aparece de leve, se bem que presente. Completa-se o ciclo
vegetativo iniciado com o florescimento (vv. 13-14), porque se mencionam os
frutos da velhice, enquanto se sublinha novamente o vigor da palma e do cedro
(v. 15). No final, o salmista abre o jogo: não se pode atribuir à
responsabilidade divina a desgraça do justo e o favor de que goza, por sua vez,
o malfeitor; o Senhor é reto e demonstra-o fortalecendo o justo na fé,
inserindo-o numa relação vital com Ele, libertando-o das areias movediças da
incredulidade.
Os Salmos da Misericórdia - Parte 3
Continuação da reflexão sobre os Salmos da Misericórdia
Proposta: antes de ler a presente reflexão, faça uma leitura orante dos salmos 51 e 57 em sua Bíblia
Proposta: antes de ler a presente reflexão, faça uma leitura orante dos salmos 51 e 57 em sua Bíblia
5. Salmo
51.
O mais famoso salmo penitencial recitado por Davi depois de cometer o adultério
e denunciado por Natã (2Sm 12,1-14).
Vv. 3-11. Confissão da culpa e pedido de perdão. Aqui se
descreve o estado de alma do penitente que, reconhecendo as suas transgressões,
invoca a misericórdia divina.
Vv. 3-4: O pedido de purificação. O pecado é mencionado com
três nomes diferentes, para exprimir a totalidade de sua transgressão. Pede-se
que estes três pecados sejam, respectivamente, apagados, lavados e purificados.
O orante invoca o pleno perdão divino, recordando o amplo leque de pecado e
fazendo apelo ao amor misericordioso de Deus, ou seja, da sua fidelidade
amorosa.
Vv. 5-8: A confissão do pecado. Após o pedido de perdão, o primeiro ato do
penitente é reconhecer o seu pecado. Tomar consciência da própria condição sem
a esconder exprime a atitude de quem se dispõe a reconciliação. O v. 7 repete a
profissão, por parte do orante, do seu estado de pecado. Ele está esmagado por
esta realidade negativa desde que foi concebido. Ao longo da história da interpretação,
com efeito, este versículo foi interpretado como prova de impureza da união
sexual até mesmo no matrimônio. Ao que parece o texto não pretende dizer tal
coisa, mas intensifica a perspectiva do penitente, que adverte uma arcaica e
conatural propensão para o pecado. Mas também é verdade que Deus lhe pode doar
sapiência para o orientar numa nova existência (v. 8).
Vv. 9-11: Invocação de purificação. A ligação clássica
pecado-castigo explica o estado de bem-estar descrito no v. 10: se o pecado
provoca a aflição, mesmo física, quando a pessoa é perdoada, é lógico que
experimente a alegria e a saúde em todas as dimensões. Se o pecado faz do homem
um esqueleto, o perdão enche-lhe de carne (cf. Ez 37). Por isso, reitera-se o
pedido de misericórdia que percorre esta primeira parte do salmo, pedindo a
Deus, depois de ter considerado as suas mazelas, que não as leve em
consideração.
Vv. 12-21. Súplica de uma nova relação com Deus. Uma vez
perdoado, a força que deriva dessa nova condição o leva a busca de uma nova
relação.
Vv. 12-14: Coração e Espírito: A presença (a face) de Deus e
o seu Espírito Santo são, por isso, imagens da mesma pessoa divina que de
maneira performativa se volta benevolente para o penitente.
Vv. 15-19: A promessa de um compromisso. Como acontece quase
sempre nas súplicas, o orante propõe-se assumir um compromisso que confirme as
suas intenções. O aleluia (v.17) dirigido a Deus é a melhor oferta que se lhe
pode fazer; vale mais do que os holocaustos e os sacrifícios rituais. Tudo é
novo na vida de quem experimentou o perdão: coração, espírito, ossos, boca,
lábios, língua. Nos vv. 18-19 formula-se o proposto de não se deter apenas num
culto exterior.
Vv. 20-21: Final comunitário. Os dois últimos versículos são
um acréscimo do tempo do exílio ou do imediato pós-exílio. Como muitas vezes
nos salmos, a comunidade chama a atenção para a necessidade de atualizar o
conteúdo do poema, relendo-o à luz dos acontecimentos que marcam a história. A
menção aqui é a exílio da Babilônia. A releitura comunitária do salmo chega à
consideração de que, se durante o exílio a matéria do sacrifício era
representado pelo choro amargo (Sl 137), agora é o momento de uma liturgia mais
pura e, portanto, mais agradável, porque inspirada por um coração humilhado.
6. Salmo
57.
Este salmo apresenta-se como uma súplica dirigida a Deus. Faz referência à fuga
de Davi das mãos do rei Saul (1Sm 24); é um testemunho vivo dos sentimentos de
angústia e confiança vividos naquele momento. A estrutura da composição é muito
simples, podendo ser divido em duas partes, intercalado por um refrão:
Vv. 2-6. Súplica. Abre-se num apelo suplicante, em busca de
abrigo, refúgio, para este se serve da bela imagem das asas, para indicar que
quando o perigo vem de baixo (dos inimigos) o Senhor eleva para o alto, longe
das insídias dos homens.
V. 4. As duas asas sob as quais o orante encontra proteção
são o amor misericordiosos e a fidelidade, uma dupla que exprime a intimidade
da natureza divina na história dos homens; quando ele se revela, o faz
manifestando o poder inspirado no amor.
V. 5. A segunda imagem é do leão, que tem a ver com a
linguagem bélica. A referência ao estar deitado em meio faz referência aos
inimigos que ocupam o mesmo espaço vital. Estes podem ser os piores.
V. 6. Um refrão fecha a primeira parte. Recorrendo ao
simbolismo cósmico-espacial do céu e da terra, o salmista exprime o poder
divino que se estende em altura e profundidade, um modo para dizer que é
ilimitado. Neste ponto da composição, o versículo apresenta-se como uma
invocação por parte de quem se encontra em dificuldades.
Vv. 7-12. Ação de graças. A segunda parte mistura motivos
sapienciais, desde a imagem da rede às imagens da alegria e do canto típicas do
hino como convite ao louvor, e conclui com o refrão do v. 12, que serve de
antífona final.
V. 7. A lei do contraste encontra-se admiravelmente neste
versículo: o mal se volta, antes ou depois, contra o seu autor. O salmista pede
justiça e quer ser subtraído às garras dos seus inimigos. Neste versículo,
confessa a sua confiança na forma de Deus agir porque sabe que quem faz o mal
será, no fim, vítima do malefício perpetrado.
Vv. 8-9. Sublinha-se a solidez do que o orante adverte,
juntamente com a vontade resoluta de exprimir de tal estado de alma inspirado
na alegria. O coração firme é uma expressão que declara a nova realidade do
penitente, é quase como um renascer.
Vv. 10-11. Depois do convite, entoa-se o canto. Podemos
vislumbrar um duplo movimento de louvor: um vertical, que tende a atingir o céu
e, com ele, o ponto mais afastado e inatingível (v.11); o outro, horizontal,
voltado para todos os povos da terra.
V. 12. O refrão encerra a segunda estrofe e todo o salmo,
colocando-se como selo das alturas místicas já atingidos pelo orante. O salmo
não diz se ele foi libertado dos seus inimigos, mas contempla a misericórdia
divina, quase se esquecendo de sua dor; poder-se-ia dizer: não importa se os
inimigos fazem ainda ouvir os seus ruídos ameaçadores, o que importa é o amor
ilimitado do Senhor, que é a melhor garantia para o fiel em dificuldade.
Os Salmos da Misericórdia - Parte 2
Continuação da reflexão sobre os Salmos da Misericórdia
Proposta: antes de ler a presente reflexão, faça uma leitura orante dos salmos 41,42 e 43 em sua Bíblia.
Proposta: antes de ler a presente reflexão, faça uma leitura orante dos salmos 41,42 e 43 em sua Bíblia.
3. Salmo
41.
Neste salmo domina o tom da súplica: um doente dirige-se ao Senhor para ser
liberto de sua enfermidade, na sólida certeza de que a sua oração será
atendida, porque o Senhor é piedoso. Podemos dividir esse poema em quatro
partes.
Vv. 2-4. Hino sapiencial. É um bem aventurado, aquele que
pode se aproximar do Senhor com confiança, pois goza de sua proteção nos
momentos mais difíceis. Assim se proclama feliz quem ama a Deus e se faz
solidário com o próximo.
Vv. 5-10. Lamento contra o inimigo. A relação delito-castigo
aparece nas palavras do orante, que invoca sobre si o perdão divino:
reconhecendo, pois, a própria culpa, ele espera a sua cura. Ele não parece
preocupado com o castigo divino, pois confia em Deus, mas teme a presença dos
inimigos. A falsidade desses supostos amigos torna particularmente desagradável
sua visita, até porque eles, ao saírem da casa do doente, desafogam a sua
maledicência, pois julgam que ele esteja doente por própria culpa. Quando um
amigo atraiçoa, há sempre um misto de surpresa e de desilusão. Os gestos de
intimidade (comer juntos) são evocados com particular angústia e lidos à luz da
nova situação de solidão.
Vv. 11-13. Profissão de fé. O salmista tem plena fé em Deus,
por ter sido liberto dessa condição indigna. Por trás dessa confiança há também
o desejo de que Deus retribua à tal maldade.
V. 14. Releitura comunitária. A experiência única e irrepetível
do orante é acolhida no patrimônio de fé da comunidade e consignada à oração de
todos. Neste versículo, a bênção dirigida ao Senhor e a menção de Israel fecham
a composição, conferindo-lhe um tom positivo e doxológico (= de louvor).
4. Salmos
42 e 43.
Originalmente formavam um único salmo, algo comprovado por alguns elementos que
se repetem. Podemos subdividi-lo em três momentos:
42,1-6: Nostalgia do passado. O poeta projeta a sua imagem
num animal, o cervo, para falar de sua busca inquieta de Deus, mas quando ele
poderá contemplar a face de Deus? O salmista encontra-se afastado de Deus,
talvez esteja no exílio, já que se recorda de suas peregrinações ao Templo. Ele
descreve um estado de desgaste interior. As lágrimas como alimento são uma
metáfora da dor profunda e prolongada. Há uma pergunta por Deus, em tom
sarcástico que vem pronunciado, provavelmente, pelos opressores (babilônicos).
Isso torna ainda mais penosa a condição do orante. No v. 6 ele descreve seu
estado de tristeza e desconforto, mas logo depois ele se reabilita diante de
Deus, pois pode continuar a louvá-lo.
42,7-12: O presente amargo. A tristeza da condição presente
(do exílio) torna ainda mais áspera a recordação do passado. O elemento
aquático reaparece, mas de modo negativo. Foi Deus que os levou para longe da
terra prometida, como punição por seu pecado. Mas em meio dos castigos e
tormentos, aparece a misericórdia divina como dom cotidiano que o Senhor
oferece ao seu fiel, por isso ele louva a Deus, ao mesmo tempo em que eleva os
seus questionamentos.
43,1-5: Com uma linguagem tipicamente forense, o orante pede
justiça a Deus, porque se sente falsamente acusado. A luz e a verdade divina
são como duas asas que podem leva-lo à montanha de Deus, ao seu templo e ao seu
altar; retornam as imagens litúrgicas do início. Ele sabe que Deus agirá e isto
torna menos amarga a condição de exilado, porque o Senhor habita no coração do
orante, fazendo já sentir a sua presença.
Os Salmos da Misericórdia
Dentro
do material produzido pelo Conselho Pontifício para a Promoção da Nova
Evangelização para o ano Santo da Misericórdia, contemplam-se os Salmos que
traduzem a misericórdia divina. Os salmos tem um significado expressivo na
tradição religiosa não só dos judeus, mas também dos cristãos; uma das heranças
que trazemos da piedade e da liturgia judaica. O objetivo do Conselho
Pontifício é oferecer um instrumento pastoral para ajudar na reflexão dos
peregrinos.
Antes
de comentar os chamados salmos de misericórdia, segue uma apresentação geral
desse livro e da importância dos salmos na vida dos fiéis e da Igreja que
utilizamos na nossa manhã de formação a título de introdução.
O Saltério, ontem e hoje. O texto
hebraico dos Salmos foi traduzido para o grego, para o uso dos judeus da
Diáspora – em meados do século II a.C. – a Septuaginta. Uma descontinuidade na
numeração provém do fato de alguns salmos de uma das tradições encontrarem-se
cindidos em dois pela outra, por exemplo, o salmo 9 e 10 da bíblia hebraica
corresponde ao 9 da tradução Grega e Vulgata; o salmo 116 da bíblia hebraica
corresponde ao 114 e 115 do Grego e da Vulgata.
-
Israel, através da sua história muitas vezes tormentosa, continuará a recitar,
a meditar e a cantar o saltério, por ocasião de suas festas nacionais e
religiosas, no ritual sinagogal, no lar – tanto que se pode escrever que os
judeus nascem com este livro nas entranhas.
-
No NT, os salmos são citados mais de 100 vezes.
- A essa longa história corresponde toda uma história
espiritual. Gerações de crentes, judeus e cristãos de todas as confissões, têm
inspirado sua oração e sua vida nos salmos. Esses textos bíblicos têm suscitado
homilias e comentários, vivificado a piedade individual e coletiva, provocado
pesquisas exegéticas. A renovação litúrgica levada a efeito nas igrejas cristãs
favorece a difusão da coletânea dos “Louvores”. É certo que a piedade autêntica
brota do coração e não se nutre de estereótipos literários. Mas o saltério não
nos oferece orações já feitas: oferece-nos orações a ser feitas, sugere-nos
“cantos novos”.
- Os salmos são a palavra de Deus; palavra que diz enquanto
um homem, arrebatado por ele, diz sua palavra humana. Portanto, eles são
revelações que levam à salvação. Mas isto em uma forma particular, ou seja, a
da oração. Não procedem da experiência de um espírito humano – por exemplo, de
um profeta – que teria conhecido a verdade divina e dito: “Assim fala o
Senhor”, mas da emoção de um homem que se dirige a Deus em oração. É deste modo
que os salmos devem ser propriamente interpretados; não pela leitura, pela
consideração, pelo estudo, mas deixando-nos levar por eles até Deus em seu
movimento.
- O ofício divino é uma liturgia da palavra e, como tal,
consiste essencialmente em um diálogo entre Deus e o seu povo: ele nos fala
pelas leituras, e nós lhe falamos com hinos e salmos. Na Eucaristia e nos
demais sacramentos, a ação estritamente sacramental é precedida por uma
liturgia da palavra, na qual o principal são as leituras, e o secundário os
salmos, ou cantos com os quais respondemos a elas. Em contrapartida, na
Liturgia das Horas, por ser acima de tudo oração de louvor e súplica, a
primazia é dos salmos, aos quais Deus responde pelas leituras. Por isso é que
as leituras da Liturgia das Horas (LH) – exceto no ofício significativamente
chamado de Leitura – são muito mais breves que a salmodia.
Assim, do conjunto de elementos que integram a LH – salmos,
leituras, antífonas, responsórios, hinos, preces, coletas etc. – o mais
importante, sem dúvida alguma, é a salmodia. O Ofício divino é,
fundamentalmente, uma salmodia adornada com alguns outros elementos.
Ao tratar da reforma do Ofício, já antes do Vaticano II, não
faltaram vozes sugerindo que a Igreja deveria ter a coragem de prescindir dos
salmos, por ser literatura de um povo muito distante de nós, tanto cultural
como religiosamente falando. Os salmos seriam pouco apropriados para expressar
a oração especificamente cristã. Mas essas vozes acabaram calando. A Igreja do
concílio e do pós-concílio não se separou da tradição bimilenar que tem o
Saltério como seu grande livro e escola de oração. A Constituição Sacrosanctum Concilium, sobre a sagrada
liturgia, nem chega a levantar a questão, mas a considera definitivamente
solucionada. Na Ordenação Geral da
Liturgia das Horas, n. 100, se diz “na Liturgia das Horas a Igreja ora
servindo-se em boa medida daqueles cânticos insignes que, sob a inspiração do
Espírito Santo, compuseram os autores sagrados no Antigo Testamento. Pois, por
sua origem, têm a virtude de elevar para Deus a mente dos homens, provocam
neles sentimentos santos e piedosos, ajudam-nos de modo admirável a dar graças
nos momentos de alegria, e lhes proporcionam conforto e firmeza de espírito na
adversidade”.
1. A
misericórdia
é uma das características divinas que o saltério mais evidencia. A palavra
misericórdia possui uma forte riqueza de significado, por isso podemos
encontra-la traduzida por: ternura, graça, indulgência, bondade, benevolência,
amor. O que revela um amor divino ‘entranhado’. No mundo bíblico, a parte mais
íntima em que têm sede os sentimentos é precisamente o ventre/seio, e isso cria
uma forte aproximação entre a Misericórdia e a geração da vida. Nesses salmos
que se seguem não só expressam uma riqueza antropológica do homem, mas espelha
também o rosto com que Deus se deu a conhecer, Ele que fala uma linguagem que
todos podem entender e que se entretém com os homens, falando-lhes como amigos
(cf. Dei verbum n. 2). Seria bom
acompanhar o breve comentário com o texto do respectivo salmo.
2. Salmo
25.
Atribuído a Davi, a composição apresenta-se como uma súplica individual: o
orante sente-se atormentado pelos seus inimigos e dirige-se confiantemente a
Deus, para que o livre dessa situação. A expressão: “A ti Senhor minha alma se
eleva” ao início do salmo traduz a atitude exigida de quem ora: ‘elevar-se’ não
só com a voz, mas com todo o seu ser para alcançar a esfera divina.
- Nos versículos 2 e 3 o salmista professa a sua confiança
em Deus, exprimindo o desejo de não ficar decepcionado; as razões de tal
esperança não se encontram ulteriormente especificadas neste versículo, porque
isso será feito ao longo de todo o poema.
- Vv. 4-5. Aparecem termos relativos ao caminho, à estrada,
às veredas, aos passos que se dão, tal como parece claro o convite a Deus para
que seja luz e nos conduza. Tal metáfora é uma alusão à conduta moral que o
orante deseja aprender diretamente de Deus.
- Vv. 6-7. De um modo imperativo (‘lembra-te’) o orante faz
apelo direto à misericórdia divina e à bondade de Deus, um estilo bíblico de
súplica. Ao mesmo tempo ele parece ‘orientar’ a Deus em como proceder para com
ele. O efeito desta inversão de papeis é a maior tomada de consciência do
próprio pecado, que assume mais intensidade precisamente no confronto coma
misericórdia divina. O salmista, já ancião, conhece o seu estado de grave
transgressão.
- Vv. 8-11. Chegamos ao coração do nosso salmo. O tema do
caminho e da aliança constitui o traço específico desta estrofe. De forma
repetida são descritas as qualidades que pertencem a Deus (bondade, retidão,
amor, fidelidade), reiterando também o conceito de Deus como mestre (vv. 8-9) e
o convite ao perdão já evocado na estrofe precedente (v. 11). Os alunos aos
quais o Senhor dirige suas lições são os pecadores e os pobres. O tema da
aliança é importante para o salmista, porque ele sabe que a misericórdia divina
está ligada ao respeito pela aliança. O orante, embora consciente do seu
pecado, abre-se com a confiança dos ‘pequeninos’ à Misericórdia divina
esperando o perdão.
- Vv. 12-15. Volta novamente o tema do temor do Senhor e da
aliança. A reflexão move-se nas coordenadas teológicas clássicas que ligam a fidelidade
de Deus ao bem-estar (saúde e descendência), que se liga ao tema da retribuição
dentro do Antigo Testamento. O salmista declara que a aliança torna o Senhor
tão íntimo do seu fiel, ao ponto de não lhe esconder nada (‘A intimidade do
Senhor é para aqueles que o temem’).
- Vv. 16-14. A oração chega à invocação direta de Deus e da
sua piedade. A súplica do salmista quer chamar a atenção sobre a sua dupla
condição miserável (submerso no pecado e vulnerável ante os inimigos). Na
realidade o que mais angustia o salmista parece ser o pecado: se é verdade que
o inimigo está no exterior, é igualmente verdade que assusta muito mais a
condição de privação da graça de Deus.
- Vv. 20-21. No fim do salmo, emergem os estados de alma que
abriram o poema, mas com uma diferença: agora, o ancião orante declarou
abertamente a sua condição e pode com maior confiança abrir-se à misericórdia
divina, esperando o perdão. Manifestar o próprio pecado, de fato, é a
precondição para obter o perdão.
- V. 22. Uma conclusão acrescentada pela comunidade orante
que acolhe o grito de um sofredor e sente-o como particularmente condizente com
sua própria condição.
As Obras de Misericórdia Corporais e Espirituais
A Palavra de Deus nos revela a
misericórdia a partir de situações concretas: “a misericórdia de Deus não é uma
ideia abstrata, mas uma realidade concreta com que Ele revela o seu amor como o
de um pai e de uma mãe que se comovem pelo próprio filho até o mais íntimo de
suas vísceras” (MV n. 6). “Eterna é a sua misericórdia” dirá o salmista (Sl
136), pois reconhece que Deus tem se manifestado assim ao longo da história do
povo eleito. Ser misericordioso significa ter um coração solidário com os que
têm necessidade. Ela se associa a ideia que temos de compaixão e perdão. Em
muitas pessoas esse agir misericordioso tem se manifestado de modo admirável,
particularmente nas dificuldades sociais, econômicas ou mesmo em desastres
naturais. A um sentimento comum que une as pessoas, a solidariedade e também a
identificação com o sofrimento do outro, que nos faz humanos.
É nessa perspectiva que se inserem
as obras de misericórdia corporais e espirituais. Jesus dá aos seus discípulos
uma ideia de comunhão ainda maior com Ele, que se fez um de nós: “Foi a mim que
fizeste” (Mt 25,40). No Antigo Testamento já o profeta pensava em ações
concretas pelo outro que se identificavam com o querer de Deus (cf. Is 58,6-7).
Jesus se identificou com a humanidade sofredora e ao mesmo tempo nos indica o
caminho do testemunho cristão, que não se situa apenas nas exigências
materiais, mas também no exercício das virtudes que se fazem necessárias para
vivenciar certas circunstâncias da vida, nossa e do outro.
Quantas situações de precariedade e
sofrimento presentes no mundo atual, lembra o Papa em sua Bula de convocação
(cf. n. 15). É a partir delas que nos abrimos para a experiência desse Ano
Santo, despertando nossa consciência tantas vezes adormecida. Lembremos as
obras de misericórdia corporal: dar de comer a quem tem fome, dar de beber a
quem tem sede, vestir os nus, dar pousada aos peregrinos, assistir aos
enfermos, visitar os presos, enterrar os mortos. Espirituais: dar bom conselho,
ensinar os ignorantes, corrigir os que erram, consolar os tristes, perdoar as
injúrias, sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo, rezar a Deus
pelos vivos e defuntos (cf. Catecismo da Igreja Católica, 2447).
No ocaso da vida seremos julgados
pelo amor, lembra São João da Cruz. Esse amor foi o desdobramento de muitas
coisas em nossa vida para torna-lo concreto nas ações de nossa vida. A liturgia
dominical nos tocará particularmente pelos relatos de Lucas nesse Tempo Comum:
Jesus veio inaugurar não só um ano, mas o tempo da misericórdia, que se desdobrará
na vida a na ação dos seus discípulos e discípulas, particularmente para com os
mais pobres, nos lembra o evangelista. Em Mateus, Jesus se identifica com os
‘pequeninos’, e penso que entendemos que ele não se refere literalmente a
crianças (Mt 10, 40.42).
Nas Sagradas Escrituras a
misericórdia se traduz como expressão de um sentimento que se experimenta
diante de uma necessidade e infortúnio, assim como a ação que surge desse
sentimento, significando ter compaixão e piedade, compadecer-se, sentir afeto
entranhável (como uma mãe), ser compassivo, amar, ter carinho e terna emoção,
apiedar-se, ajudar como fruto de uma relação de fidelidade, nas ações concretas
que isso comporta. O próprio Jó traduz o que foi a sua vida de piedade (cf. Jó
31,16-17.19-21). O autor do Eclesiástico aponta um caminho (cf. Eclo
7,32-35). No Novo Testamento
encontraremos vários textos que bebem dessas mesmas fontes antigas, mas que
tiveram uma clara compreensão a partir das palavras e do agir de Jesus:
“Felizes os que são misericordiosos, porque encontrarão misericórdia” (Mt 5,7)
diz Jesus em Mateus, já apontando para o seu discurso sobre o juízo universal
(Mt 25,31-46). São muitos os comentários dos Santos Padres sobre esse texto e
seus significados práticos na vida cristã.
No seu corpo, o ser humano pode
experimentar a falta de recursos ou sofrer carências que são constantemente
necessárias, sejam internas ou externas. Dar de
comer a quem tem fome (Mt 25,35) tornou-se uma obra eclesial derivada da
ação de Jesus. Sabemos que ainda em muitos países pobres persiste a carência de
alimentação e quantas vidas sucumbem diante dessa realidade. Erradicar a fome
no mundo faz parte dessa nova era global para preservar a paz e da subsistência
da terra, a escassez não vem tanto no aspecto material, mas na falta de
recursos sociais. O gesto da Eucaristia, partilha, doação, nos recorda
constantemente que há uma fome que só Jesus pode saciar, e há uma outra que com
Ele podemos aprender a sanar. Dar de
beber a quem tem sede (Mt 25,35). A água tem um profundo significado no
mundo bíblico e hoje é discutido em seu significado ecológico no compromisso de
conservação dos mananciais e do acesso a todos a água potável. Vestir o nu (Mt 25,36). Na Bíblia a
nudez tem um tom negativo, seja como fruto do pecado ou da indigência de quem
não tem o necessário para defender-se do frio. Repartir, como fizeram alguns
santos, é um gesto de solidariedade humana. Acolher o forasteiro (Mt 25,35). Israel, em sua condição de
peregrino, não deve esquecer a sua experiência e deve estar atento aos que
sofrem a mesma condição. Algumas sociedades se organizam com centros de
acolhimento ao forasteiro. Assistir os
enfermos (Mt 25,36). A doença revela a fragilidade humana em sua finitude,
por isso a Sagrada Escritura recomenda a visita, a presença e o conforto
(oração, unção dos enfermos [At 28,8s; Tg 5,14s]), também a ajuda necessária. Visitar os presos (Mt 25,36). A solidão
gerada pelo isolamento da sociedade deve solicitar da mesma algum gesto de
solidariedade ao encarcerado. No mundo bíblico, particularmente do Novo Testamento,
a comunidade cristã deve ser solidária (comunhão de oração) e presente materialmente
aos encarcerados por motivos de fé, como o foram os apóstolos e o próprio
Paulo. A Pastoral Carcerária leva em conta não somente o preso, mas também sua
família. Por traz desse trabalho há também uma reflexão de caráter político
sobre a dignidade do homem e dos direitos humanos. Enterrar
os mortos (Tb 1,17; 12,12s). Essa prática comum a muitos povos, era vista
por Israel como uma obra de piedade, particularmente destacada no livro de
Tobias. Quanto a cremação, mesmo preferindo a inumação, a Igreja já não faz
objeção em acompanhar religiosamente os que fazem tal opção. Essa obra de
misericórdia está associada à nossa fé na imortalidade do ser humano.
Os seres humanos sofrem carências
relativas à sua dimensão espiritual, daí as obras de misericórdia espirituais,
que tem um valor ainda maior que as de ordem material. Se as outras obras podem
ter um caráter mais comunitário ou organizativo para vivê-las, as de ordem
espiritual são confiadas a cada indivíduo. A sua formulação remonta a época
patrística, já com Orígenes e sua interpretação alegórica de Mt 25. Santo
Agostinho estendeu tal reflexão sendo coroada no mundo acadêmico
particularmente por São Tomás de Aquino. Elas estão agrupadas nos três blocos
que se seguem.
-
Ser vigilantes. Um olhar para fora
de nós mesmos, numa atitude de compaixão e amor em relação a todos os
necessitados e em favor dos ignorantes e errantes. Dar bom conselho, que
conduzam para o bem e a salvação do indivíduo, tanto quanto é importante
‘ouvir’ o próprio coração ou a consciência, pedindo a Deus a sabedoria
necessária. Para o nosso tempo o mais sensato é aconselhar provocando
interrogações quando se está em jogo o sentida da vida e o futuro do indivíduo.
Ensinar os ignorantes, vai na linha da ajuda aos que querem compreender
os caminhos da fé. Corrigir o que erra, particularmente no contexto dos
conflitos que se dão na comunidade de fé (Mt 18,15-17; cf. Tb 3,10), a chamada
correção fraterna. Esta exige discernimento sobre o quando, o modo, o conteúdo
necessário, como ajuda e não como juízo, tendo presente a regra de ouro: faça
ao outro o que você gostaria que lhe fizessem.
- Ter espírito conciliador. Tal espírito se exerce como atributo
fundamental do discípulo de Cristo. Consolar os tristes. O Deus
consolador foi experimentado por Israel em vários momentos de sua história;
Jesus é também consolador, pois oferece alívio a todos aqueles que estão
cansados e esgotados (cf. Mt 11,28-30). Paulo bem o experimentou em suas
tribulações. A função de consolar, na Igreja, é essencial já que testemunha o
Deus que consola os pobres e aflitos. Perdoar as injúrias. O Deus que
perdoa nos convida a perdoar, exorta Jesus, ao mesmo tempo que nos chama à
consciência de que também somos pecadores. Só o perdão possibilita uma um novo
amanhã. Suportar com paciência as fraquezas do nosso próximo. Se Jó é o
modelo de paciência no Antigo Testamento, a paciência de Jesus sublinha a sua
tolerância para com o pecador. A paciência é fruto do Espírito, tal como o
amor. Suportando pacientemente as limitações alheias devemos refletir sobre as
nossas que também são um peso para os outros.
- Orar (rogar a Deus pelos vivos e defuntos).
A oração tem profunda relação não só com Deus, mas com a vida. Ela traduz nossa
comunhão eclesial que nos leva a rezar uns pelos outros, e também pelos que já
partiram, pois em nenhum momento se interrompe essa união, já que cremos na
ressurreição e expressa a nossa comunhão com os santos. A oração de intercessão
prepara e dispõe para viver e aceitar a vontade de Deus, seja ela qual for.
Pelas obras de misericórdia se
testemunha de maneira concreta o amor preferencial pelos pobres, que nos lembra
o Papa Francisco, não é opcional, mas uma questão básica do Evangelho. A opção
e o amor preferencial pelos pobres implicam uma percepção e compreensão das
diversas classes de pobreza às quais se referem as obras de misericórdia
corporais e espirituais. A pobreza
mais elementar é a de ordem física ou
econômica que incluem não só as quatro primeiras obras corporais, mas também a
falta de trabalho e de emprego, as doenças e incapacidades graves. Temos a pobreza cultural com o analfabetismo,
escassez de oportunidades de formação comprometendo o futuro do indivíduo e
gerando a exclusão social e cultural. Tal pobreza contemplam as três primeiras
obras espirituais. A pobreza social
situa-se no campo da solidão e isolamento, das perdas, das dificuldades de
comunicação social, da discriminação e marginalização, etc. Tal realidade é
contemplada nas três últimas obras corporais e na quinta e sexta espirituais.
Por fim temos a pobreza espiritual e
de alma, como a desorientação, o vazio interior, o desconsolo e o desespero
sobre o sentido da própria existência. A justiça maior do Reino que buscamos
viver e sobre a qual seremos julgados não incluem tanto os mandamentos divinos,
mas o bem que somos capazes de fazer. Da doação e do serviço ao modelo de
Jesus, pois a misericórdia supera a justiça.
Pe. João
Bosco Vieira Leite
Celebrar o Jubileu da Misericórdia
Esse é o primeiro aspecto apresentado
na coleção “Misericordiosos como o Pai” do Conselho Pontifício para a Promoção
da Nova Evangelização publicado pelas editoras Paulinas e Paulus aqui no
Brasil. A coleção consta de oito volumes cujos aspectos gostaria de
compartilhar com vocês que buscam melhor vivenciar esse período: “Cada vez que
a Igreja celebra os sacramentos, não faz mais do que tornar sempre viva e
presente a misericórdia do Pai, que age através do Filho e transforma o coração
dos inquietos e a matéria dos sacramentos em graça eficaz para a nossa
salvação” (Celebrar a Misericórdia – Subsídio Litúrgico).
Se há um
aspecto que sempre marcou os muitos jubileus celebrados pela nossa Igreja são
as celebrações litúrgicas que aconteceram em Roma, presididas pelo Santo Padre.
A inovação de Francisco, que desde sempre vem nos surpreendendo em seu
pontificado foi estender às Igrejas particulares, particularmente às igrejas
catedrais, a abertura de uma ‘posta santa’ para um maior envolvimento das
dioceses espalhadas no mundo inteiro na vivência desse Ano Santo, em comunhão
com a Igreja em Roma. Cada diocese pode também indicar outras igrejas para a
peregrinação dos fiéis que julgar oportuno para melhor abranger e envolver a
diocese.
- O Ano Litúrgico.
Nesse ano litúrgico que estamos
celebrando, o evangelho de Lucas (Ano C) traz especial retrato da misericórdia
divina em muitos dos seus textos. Oportunamente devemos tornar ainda mais evidente
a cada domingo, onde celebramos o mistério pascal, como os fiéis podem viver
tais aspectos da misericórdia divina, incutindo esse pensamento da prática da
caridade e do apostolado, pois nossa relação com o Senhor implica a partilha
desse amor que ele faz arder em nosso coração. Nossa alegria verdadeira está em
permanecer em comunhão com o seu mandamento de amor.
A Quaresma,
por sua natureza, já nos convida a uma especial contemplação da misericórdia
divina com os ritos próprios desse período. O Papa nos lembra e nos pede a
especial meditação das páginas da Sagrada Escritura que nos ajudam a
redescobrir o rosto misericordioso de Deus. Mais à frente comentaremos sobre as
parábolas da misericórdia, outro volume dessa publicação do Conselho
Pontifício. A Quaresma tem como fim a celebração da Páscoa e para bem
celebrá-la revivemos a necessidade da conversão como caminho de renovação
espiritual, tendo a Semana Santa e o Tríduo Pascal como cume desse caminho
espiritual/litúrgico que revelam o desejo salvador de Deus que se perpetua ao
longo da história. Sim, seu amor é sem fim e nas águas do batismo renovamos
nossa fé para experimentarmos também hoje esse amor.
Outras
festas e solenidades do calendário litúrgico nos servirão de oportunidade para
trazer à tona esse tema da misericórdia. O subsídio lembra a Festa da Exaltação
da Santa Cruz (14 de setembro) e a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus (03
de junho). A cruz como sinal eminente da misericórdia de Deus e da vitória de
Cristo sobre a morte pode ganhar especial atenção durante o Ano Litúrgico. O
olhar contemplativo a essa realidade íntima e essencial do Filho de Deus em seu
Coração, sede da misericórdia do Pai, seja acompanhada de momentos de oração
pelos sacerdotes, primeiros dispensadores da misericórdia divina, e pela vida
consagrada (religiosos e religiosas). Esse ano celebra-se os cento e sessenta
anos da instituição dessa festa por Pio IX, em 1856.
- A Celebração dos Sacramentos
A celebração dos sacramentos nesse
ano deve fazer transparecer “a misericórdia e a solicitude do Pai por cada um
dos seus filhos”. Além da Eucaristia, como celebração central da fé, outros
sacramentos devem ganhar especial atenção: o Batismo, a Reconciliação e sua
estreita relação com o sacramento da Eucaristia, a Unção dos Enfermos.
Nesses
últimos tempos se vem enfatizando a questão do acolhimento e particular atenção
aos que tentam se aproximar da comunidade após um certo período de afastamento
ou mesmo a aproximação destes a partir de sua realidade existencial. A ênfase
ao Ato Penitencial num maior uso da diversidade oferecida pelo Missal como
chamado a celebração da misericórdia. Nas preces se façam presentes o desejo da
ação da misericórdia de Deus sobre o povo, sobre os sacerdotes. O uso maior das
orações Eucarísticas da reconciliação I e II. A presença da Virgem Maria, mãe
de misericórdia possa se destacar pelas missas votivas que enfatizam a sua
presença na caminhada eclesial tanto quanto as outras missas e orações pelas
várias necessidades.
- Rezar Juntos
Além de
programar momentos de oração comunitária, ressalte-se o valor da Oração da
Liturgia da Horas rezada com a comunidade particularmente a Laudes e Vésperas
que ressalta a importância e o alimento espiritual que os salmos trazem à vida
cristã. Particularmente se tenha a atenção para os salmos da misericórdia,
dedicando-lhes, se possível algum comentário que ressalte sua riqueza.
A Adoração
ao Santíssimo, já presente na vida comunitária é um momento oportuno para
implorar o perdão e a paz. A proximidade das Igrejas cristãs pode também
promover momentos específicos de oração onde a procura da unidade, do respeito
recíproco e da paz dos corações favoreçam sempre mais a aproximação dos irmãos
que comungam da fé no mesmo Deus.
Um outro
elemento que não se pode desprezar é o que diz respeito às práticas da piedade
popular. A peregrinação é um desses costumes que entram particularmente no
calendário celebrativo dessa no da misericórdia, tão presente na tradição do
Antigo testamento, serve de sinal para o caminho que cada pessoa faz na sua
existência. As devoções que cercam o mistério da Cruz, como a Via-Sacra,
particularmente na Quaresma, as devoções voltadas para Virgem Maria, Mãe do
crucificado a recitação do Terço da Misericórdia, chamada no texto ‘Coroinha à
Divina Misericórdia’, já que a o nome ‘terço’ diz respeito a ‘uma parte de’, o
que não se aplica a essa devoção. Divulgação e recitação da Oração pelo Jubileu da Misericórdia.
Alguns
lugares e elementos ganham particular relevância em seu apelo simbólico, como o
altar de nossas igrejas onde se dá o sacrifício de Cristo e o baquete
eucarístico. A porta dos nossos templos e particularmente dos locais de
indulgência esse ano, devem ganhar particular destaque. A fonte batismal onde a
Igreja nasce e renasce constantemente para os o a tem como lugar fixo, uma
melhor iluminação e adorno necessário sem esquecer a presença do Círio Pascal.
O confessionário fixo deve ser também revisado como lugar que realmente
favoreça a celebração penitencial tanto quanto o acolhimento do fiel.
Recorda-se a
prática da comunhão espiritual para aqueles que por algum motivo estejam
impedidos de participar da Eucaristia. A prática de recolher-se em si mesmo no
momento da celebração ou mesmo como prática espiritual durante o dia ou na
visita ao Santíssimo Sacramento, expressões do ardente desejo de receber Jesus
em seu coração.
- Lectio Divina
A Leitura
Orante da Palavra de Deus tem ganhado particular destaque nesses últimos anos,
quase como uma redescoberta desse tesouro da fé. Assim o subsídio oferece
alguns trechos da Sagrada Escritura acompanhados do comentário que está no
volume “As parábolas da Misericórdia” com alguns salmos para a oração, seguindo
o esquema: Escutar (ler), Meditar (refletir sobre o texto servindo-se de algum
comentário ou mesmo das notas vindas na Bíblia), Rezar (de modo pessoal, sobre
o que esse texto diz para você ou servir-se de alguns salmos relacionados ao
texto). Ali estão: A Parábola do Filho
Pródigo (Lc 15) + Salmos: 51 e 25; A Parábola do Bom Samaritano (Lc 10) +
Salmos: 41 e 142; A Pecadora que lava os pés de Jesus (Lc 7) + Salmos 24 e 42.
Conclusão: O subsídio sobre a celebração do
Jubileu se encerra com um rito para a abertura da Porta Santa tanto em Roma
quanto nas Igrejas particulares e o rito de encerramento do Jubileu nas Igrejas
particulares.
Oração para o Jubileu
da Misericórdia
Senhor Jesus
Cristo,
Vós que nos ensinastes a sermos misericordiosos como o Pai celeste,
e nos dissestes que quem Vos vê, vê a Ele.
Mostrai-nos o Vosso rosto e seremos salvos.
O Vosso olhar amoroso libertou Zaqueu e Mateus da escravidão do dinheiro;
a adúltera e Madalena de colocar a felicidade apenas numa criatura;
fez Pedro chorar depois da traição
e assegurou o Paraíso ao ladrão arrependido.
Fazei que cada um de nós considere como dirigida a si mesmo as palavras que dissestes à mulher samaritana:
Se tu conhecesses o dom de Deus!
Vós que nos ensinastes a sermos misericordiosos como o Pai celeste,
e nos dissestes que quem Vos vê, vê a Ele.
Mostrai-nos o Vosso rosto e seremos salvos.
O Vosso olhar amoroso libertou Zaqueu e Mateus da escravidão do dinheiro;
a adúltera e Madalena de colocar a felicidade apenas numa criatura;
fez Pedro chorar depois da traição
e assegurou o Paraíso ao ladrão arrependido.
Fazei que cada um de nós considere como dirigida a si mesmo as palavras que dissestes à mulher samaritana:
Se tu conhecesses o dom de Deus!
Vós sois o
rosto visível do Pai invisível,
do Deus que manifesta Sua onipotência, sobretudo com o perdão e a misericórdia.
Fazei que a Igreja seja no mundo o rosto visível de Vós, Senhor, ressuscitado e na glória.
Vós quisestes que os Vossos ministros fossem também eles revestidos de fraqueza,
para sentirem justa compaixão por aqueles que estão na ignorância e no erro:
fazei que todos os que se aproximarem de cada um deles se sintam esperados, amados e perdoados por Deus.
do Deus que manifesta Sua onipotência, sobretudo com o perdão e a misericórdia.
Fazei que a Igreja seja no mundo o rosto visível de Vós, Senhor, ressuscitado e na glória.
Vós quisestes que os Vossos ministros fossem também eles revestidos de fraqueza,
para sentirem justa compaixão por aqueles que estão na ignorância e no erro:
fazei que todos os que se aproximarem de cada um deles se sintam esperados, amados e perdoados por Deus.
Enviai o Vosso
Espírito e consagrai-nos a todos com a Sua unção,
para que o Jubileu da Misericórdia seja um ano de graça do Senhor
e a Vossa Igreja possa, com renovado entusiasmo, levar aos pobres a alegre mensagem e
proclamar aos cativos e oprimidos a libertação;
aos cegos restaurar a vista.
para que o Jubileu da Misericórdia seja um ano de graça do Senhor
e a Vossa Igreja possa, com renovado entusiasmo, levar aos pobres a alegre mensagem e
proclamar aos cativos e oprimidos a libertação;
aos cegos restaurar a vista.
Nós Vo-lo
pedimos por intercessão de Maria, Mãe de Misericórdia,
a Vós que viveis e reinais com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos.
a Vós que viveis e reinais com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos.
Amém.
Para viver o Ano Jubilar da Misericórdia
Queridos
irmãos e irmãs que nos acompanham através desse blog, nosso desejo é ajudá-los
a vivenciar esse ano da Misericórdia partilhando com vocês alguns artigos
inspirados no material que o Conselho Pontifício da Nova Evangelização preparou
esse ano em que foi publicado conjuntamente pela Paulus e Paulinas. São oito
livros com temáticas diferentes cujas ideias principais ou linhas de reflexão
partilharemos com vocês.
Nós
já trabalhamos a Bula papal em nossos encontros de formação no ano anterior,
por isso o nosso primeiro texto a ser partilhado é uma síntese da mesma para
situar-nos no contexto do convite feito pelo Santo Padre. Certamente há outros
subsídios na internet que podem também ser interessantes. A nossa humilde
contribuição quer apenas situar-nos no contexto desse ano jubilar. Bom proveito!
Pe.
João Bosco Vieira Leite.
TEXTO 01
Síntese da Bula de convocação do Jubileu
Extraordinário da Misericórdia
Vaticano, 11 de abril de 2015
Vaticano, 11 de abril de 2015
Boletim
da Santa Sé
Tradução: André Cunha
Tradução: André Cunha
A Bula de convocação do Jubileu
Extraordinário da Misericórdia intitulada “vultus Misericordiae”
se compõe de 25 números. O Papa Francisco descreve as principais
características da misericórdia, definindo o tema, antes de tudo, à luz do
rosto de Cristo. A misericórdia não é uma palavra abstrata, mas um rosto para
reconhecer, contemplar e servir. A Bula se desenvolve em chave trinitária
(número 6-9) e se estende na descrição da Igreja como um sinal visível da
misericórdia: “A misericórdia é a viga mestra que sustenta a vida da Igreja” (n
. 10).
Francisco
indica as etapas principais do Jubileu. A abertura coincide com os 50 anos da
conclusão do Concílio Vaticano II: “A Igreja sente a necessidade de manter vivo
este evento. Para ela, iniciava um novo período de sua história. Os padres
reunidos em Concílio haviam percebido intensamente, como um verdadeiro sobro do
Espírito, a exigência de falar de Deus aos homens de seu tempo de um modo mais
compreensível. Derrubadas as muralhas que por muito tempo haviam isolado a
Igreja em uma cidadela privilegiada, havia chegado o tempo de anunciar o
Evangelho de um modo novo” (n. 4). A conclusão terá lugar na Solenidade
litúrgica de Jesus Cristo Rei do Universo, em 20 de novembro de 2016. Neste
dia, fechando a Porta Santa, teremos antes de tudo, sentimentos de gratidão e
apreço à Santíssima Trindade por haver-nos concedido um tempo extraordinário de
graça. Encomendaremos a vida da Igreja, da humanidade inteira e o imenso cosmos
ao Senhorio de Cristo, esperando que difunda sua misericórdia como o orvalho da
manhã para uma história fecunda, que ainda será construída com o compromisso de
todos num futuro próximo.
Uma
particularidade deste Ano Santo é que não será celebrado só em Roma, mas em
todas as dioceses do mundo. A Porta Santa será aberta pelo Papa na Basílica de
São Pedro em 8 de dezembro e no domingo seguinte em todas as Igrejas do mundo.
Outra novidade é que o Papa dará a oportunidade de abrir a Porta Santa também
em todos os Santuários, destino de muitos peregrinos.
O
Papa Francisco recorda o ensinamento de São João XXIII que fala da “medicina da
Misericórdia” e Paulo VI que identificou a espiritualidade do Vaticano II como
a do Bom Samaritano. A Bula também explica alguns aspectos importantes do
Jubileu: o primeiro é o lema “Misericordiosos como o Pai”, a continuação do sentido
da peregrinação e sobretudo a necessidade do perdão. O tema particular que
interessa ao Papa se encontra no número 15: as obras de misericórdia
espirituais e corporais devem redescobrir-se “para despertar nossa consciência,
muitas vezes adormecida frente ao drama da pobreza, e para entrar ainda mais no
coração do Evangelho, onde os pobres são os privilegiados da misericórdia
divina”. Outra indicação faz relação com a Quaresma com o envio dos
“Missionários da Misericórdia” (n. 18). Nova e original iniciativa, com a qual
o Papa quer ressaltar de forma mais concreta seu cuidado pastoral. O Papa trata
nos números 20 e 21 o tema da relação entre justiça e misericórdia,
demonstrando que não se detém a uma visão legalista, mas aponta a um caminho
que desemboca no amor misericordioso.
O
número 19 é um firme lamento contra o crime organizado e contra as pessoas
“promotoras ou cúmplices” da corrupção. São palavras muito fortes com as quais
o Papa denuncia esta “chaga apodrecida” e insiste para que neste Ano Santo haja
uma verdadeira conversão: “Este é o tempo oportuno para mudar de vida! Este é o
tempo para deixar tocar o coração. Diante de tantos crimes cometidos, escuta o
choro de todas as pessoas depredadas por vocês na vida, na família, nos afetos
e na dignidade. Seguir como estais é só fonte de arrogância, de ilusão e de
tristeza. A verdadeira vida é algo bem distinto do que agora pensais. O Papa os
estende a mão. Está disposto a ouvi-los. Basta somente que acolhais o apelo à
conversão e vos submetais à justiça enquanto a Igreja vos oferece misericórdia”
(n. 19).
A
referência à Indulgência como tema tradicional do Jubileu se expressa no número
22. Um último aspecto original é o da misericórdia como tema comum entre os
Judeus e Muçulmanos: “Este ano Jubilar vivido na misericórdia pode favorecer o
encontro com estas religiões e com as outras nobres tradições religiosas; nos
faça mais abertos ao diálogo para conhecê-las e compreendê-las melhor; elimine
toda forma de impasse e desprezo, e leve qualquer forma de violência e de
discriminação” (n. 23).
O
desejo do Papa Francisco é que este Ano, vivido também no compartilhamento da
misericórdia de Deus, possa converter-se em uma oportunidade para “viver no dia
a dia a misericórdia que desde sempre o Pai dispensa a nós. Neste Jubileu,
deixemo-nos surpreender por Deus. Ele nunca se cansa de abrir a porta de Seu
coração para repetir que nos ama e quer compartilhar conosco a sua vida… […]
Que este Ano Jubilar da Igreja se converta em eco da Palavra de Deus que ressoa
forte e decidida com palavra e gesto de perdão, de suporte, de ajuda, de amor.
Nunca se canse de oferecer misericórdia e seja sempre paciente em confortar e
perdoar. A Igreja se faça voz de cada homem e mulher e repita com confiança e
sem descanso: ‘Lembra-te, Senhor, de tua misericórdia e de teu amor; que são
eternos.’”
Assinar:
Postagens (Atom)